Prevenir é melhor que remediar. O uso de vacinas tem a melhor relação de risco -benefício para o controle de doenças imunopreveníveis que o uso de medicamentos para sua cura. Resultado de séculos de investimentos em pesquisas e desenvolvimento científico e tecnológico, as vacinas são seguras e consideradas essenciais para a saúde pública. Elas podem ser constituídas de componentes dos próprios micro-organismos (proteínas, DNA ou RNA), pelos micro-organismos inteiros inativados (mortos) ou pelos micro-organismos vivos atenuados.

As vacinas são preparações que, ao serem introduzidas no organismo, desencadeiam uma reação do sistema imunológico (semelhante à que ocorreria no caso de uma infecção por determinado vírus ou bactéria), estimulando a formação de anticorpos e tornando o organismo imune a esse agente e às doenças por ele provocadas.

Fundamentalmente, as vacinas são seguras. Da descoberta até chegar ao produto disponível para uso nos postos de saúde, são muitas etapas de desenvolvimento tecnológico.
Cada etapa tem especificidades e requerimentos diferentes e necessitam de protocolos específicos, instalações laboratoriais e equipamentos diferenciados, além de recursos humanos altamente especializados e treinados.

Além disto, cada etapa de desenvolvimento precisa obter resultados reproduzíveis, mesmo quando realizados em outros laboratórios, por outros profissionais.

As vacinas livraram a humanidade da varíola e estão próximas de nos livrarem da poliomielite. Além disto, têm nos protegido de outras doenças, como sarampo, caxumba, rubéola, febre meningite, amarela, pneumonias, dentre outras.

Elas podem ser virais, quando combatem vírus; ou bacterianas, quando combatem bactérias.

Por isso, elas nos acompanham desde os primeiros meses da nossa vida até chegarmos à terceira idade. Além disso, as vacinas garantem a proteção não apenas de sua saúde, mas também daqueles com quem você convive: família, amigos e parentes.

A descoberta da vacina

A varíola, primeira doença erradicada na História, devido às vacinações em massa, faz parte do contexto da descoberta das vacinas. A palavra “vacina”, aliás, vem do latim vaccinus, de vacca (vaca). Consequência de o médico inglês Edward Jenner ter observado que pessoas que ordenhavam vacas não contraíam a varíola.

A partir da observação, Jenner resolveu extrair o pus da mão de uma ordenhadora que havia contraído a doença e o inoculou em um menino saudável, de oito anos. O menino contraiu a doença de forma branda e logo ficou curado. Isto em 1796.

Jenner, entretanto, só foi reconhecido como o inventor da vacina anos depois, quando médicos de outros países adotaram métodos semelhantes de vacinação e obtiveram resultados positivos na prevenção de outras doenças.

As etapas de produção

Desde Jenner, como era de se esperar, a ciência e a tecnologia avançaram sobremaneira na obtenção das vacinas. O processo de produção de uma vacina e o caminho que ela percorre até chegar aos postos de saúde de todo o Brasil começam na produção do ingrediente farmacêutico ativo (IFA), que nada mais é do que a matéria-prima da vacina. O IFA é composto por partes do próprio micro-organismo (proteínas, DNA ou RNA), pelos micro-organismos inteiros inativados (mortos) ou pelos micro-organismos vivos atenuados, concentrados e formulado com estabilizadores.

Feito isso, vamos ao que chamamos de processamento final da vacina, que inclui as etapas de formulação, envase, liofilização, e rotulagem e embalagem.

Na formulação, são adicionados ao concentrado vacinal os componentes que vão estabilizar a vacina e diluir a concentração do vírus – no caso de vacinas virais – ou do polissacarídeo – no caso de vacinas bacterianas - na fração ideal para poderem ser aplicadas nas pessoas.

No envase, as vacinas saem de grandes tanques de aço inox para os pequenos frascos de vidro, os mesmos que você vê quando vai ao posto de saúde. Após os frascos receberem a vacina, eles são fechados com uma rolha de borracha.

Para as vacinas líquidas, este fechamento é total e os frascos são encaminhados para a recravação, ou seja, para receberem um lacre de alumínio. Existem também as vacinas liofilizadas, em que o líquido é transformado em uma espécie de pastilha para conservar as suas propriedades.

A partir do envase, elas são fechadas apenas parcialmente e os frascos são levados para um equipamento chamado liofilizador, que faz essa transformação. Após a conclusão do ciclo de liofilização, os frascos são fechados com rolhas de borracha. 

A última etapa do processamento final é a rotulagem e embalagem, quando os frascos recebem os rótulos com a identificação da vacina, número de lote, data de fabricação e validade, além de outras informações importantes, e são colocados nos “cartuchos”, caixas que protegem estes frascos. 

Nos postos de saúde, para serem aplicadas, as vacinas liofilizadas precisam de um diluente, composto normalmente por “água para injetáveis”, modalidade mais pura de água, que são colocados em ampolas com número de doses equivalente ao dos frascos das vacinas.

O controle da qualidade

Mas antes das vacinas e dos diluentes serem totalmente embalados, são retiradas amostras que seguem para rígido controle de qualidade, que garante a segurança e eficácia daquela vacina que será aplicada nos postos de saúde.

No caso das vacinas produzidas pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), os “cartuchos” são colocados em caixas de embarque e depois transferidos para o almoxarifado do Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos), unidade da Fiocruz responsável pela produção de medicamentos biológicos, até os resultados do controle de qualidade ficarem prontos, liberando os lotes para distribuição. 

Do almoxarifado as vacinas são transportadas para o almoxarifado central do Ministério da Saúde, em São Paulo, para que de lá possam seguir para os estados e municípios, chegando aos postos de saúde de todo o território brasileiro.

Além dos testes de qualidade, toda e qualquer vacina precisa, antes de ser oferecida à população, ter o registro da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Estudos pré-clínicos e clínicos

Antes que isto ocorra, as vacinas em desenvolvimento passam por estudos pré-clínicos (em animais) e clínicos (em seres humanos).

Quando aos estudos pré-clinícos terminam, é previsto que já existam j resultados demonstrando a prova de conceito. Em seguida são realizados os estudos clínicos de fases 1, 2, e 3. Estas etapas de desenvolvimento levam em torno de 10 a 15 anos pelos procedimentos clássicos.

Confira abaixo como ocorre cada um deles:

- Ensaio clínico de fase I: a vacina candidata é administrada a um pequeno número de pessoas (frequentemente varia de 10 a 100 participantes de pesquisa) para testar a segurança e a dose, além de avaliar a sua capacidade inicial em estimular o sistema imunológico.

- Ensaio Clínico de fase II: nesta etapa a vacina é administrada em centenas de pessoas (frequentemente varia de 100 a 1000 participantes de pesquisa) para obter mais dados sobre segurança, bem como avaliar a capacidade da vacina de estimular o sistema imunológico (eficácia).

- Ensaio Clínico de fase III: a vacina candidata é administrada a milhares de pessoas (frequentemente mais de 1000), visando confirmar a sua eficácia (isto é, a prevenção da infecção) e conhecer mais dados sobre reações adversas em grupos variados de indivíduos (crianças e idosos, por exemplo). Estes testes podem determinar se a vacina protege contra o SARS-Cov-2. Os ensaios clínicos de fase III também são conhecidos como ensaios para registro ou pivotais (o termo vem de pivô, os mais importantes, os principais, os centrais).

Monitoramento constante

Existe ainda a chamada “fase 4”, o estudo de farmacovigilância realizado após o produto ser licenciado pela agência reguladora, como a Anvisa no caso do Brasil. A farmacovigilância monitora a eficácia terapêutica e a frequência de reações adversas das vacinas já registradas e usadas pela população.

O objetivo é garantir que os benefícios relacionados por elas sejam maiores que os riscos, pois após os estudos clínicos exigidos para que se tenha o registro, as vacinas passam a ser usadas por um número muito maior de pessoas. E assim eventos raros podem ser notificados.

Abrimos aqui um parêntesis: no desenvolvimento da vacina COVID-19, foi utilizado o procedimento de "fast track", com as etapas sendo realizadas em paralelo ou de forma comprimida, seguindo para a etapa seguinte tão logo existam resultados preliminares. Os estudos clínicos também foram colocados em conjunto, como estudos de fase 1 e fase 2, e de fase 2 com fase 3, de tal forma a acelerar todo as etapas de desenvolvimento da vacina. Isto ocorre por conta de vivermos uma pandemia, algo que não ocorria há cerca de um século.

Benefício para a saúde, e as economias também

Além de representarem a melhor opção de risco-benefício para a saúde de cada indivíduo, as vacinas também representam a melhor opção para a sustentabilidade dos sistemas de saúde.

Estudo publicado na Health Affairs por pesquisadores na John Hopkins University (EUA) examinou a economia obtida com programas de vacinação para os sistemas de saúde, na comparação com os custos de medicalização caso as vacinas não fossem aplicadas - custos de tratamento, custos de transporte, pagamentos a cuidadores e perdas em produtividade – e também calculou os benefícios mais amplos da vacinação.

Com o recorte de taxas de vacinação projetadas de 2011 a 2020, para a imunização contra 10 infecções evitáveis por vacina: Haemophilus influenzae tipo b, hepatite B, papilomavírus humano, encefalite japonesa, sarampo, Neisseria meningitis sorogrupo A, rotavírus, rubéola, Streptococcus penumoniae e febre amarela, chegou-se ao resultado da economia de US$ 586 bilhões em custos de doença associados em um total de 94 países, com retorno de US$ 16 para cada US$ 1 investido em vacinas.

Segundo o autor do estudo, Sachiko Ozawa, “nossos achados devem encorajar doadores e governos a continuarem seus investimentos financeiros em programas de imunização. Mas devemos manter em mente que essas são estimativas que assumem que a cobertura da imunização continua a se expandir e melhorar”.

Portanto, como a presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima, afirmou, a “Vacinação é um bem público” e a população deve se proteger mantendo as pessoas vacinadas, pois é grave “A ameaça da baixa cobertura vacinal pelo SUS”, como afirmam os especialistas Akira Homma e Cristina Possas.

 

Jornalista: Paulo Schueler


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