A Quarta Revolução Industrial em curso, também chamada de Indústria 4.0, traz mudanças para a forma como produzimos, consumimos e nos relacionamos. Marcada pelo desenvolvimento acelerado das tecnologias digitais, vem transformando várias esferas da vida em sociedade. Para discutir os impactos dessa nova era na Medicina, o CEE-Fiocruz conversou com o pesquisador Luiz Vianna Sobrinho, do Observatório da Medicina da Ensp.

Médico e autor dos livros Medicina financeira, a ética estilhaçada e O ocaso da clínica – a Medicina de Dados, Vianna fala nessa entrevista sobre as mudanças que estão acontecendo no campo da medicina a partir do avanço dessas novas tecnologias e, diante desse cenário de transformação digital, faz uma análise sobre como o SUS vem respondendo a essas mudanças e quais seriam as perspectivas para o uso dessas tecnologias pelo serviço público de saúde.

 

CEE-Fiocruz - Em sua tese de doutorado, defendida na Fiocruz em 2020, você faz uma reflexão sobre o desenvolvimento histórico da medicina nos últimos quarenta anos. Diz que, com o avanço das novas tecnologias e o uso da Medicina de Dados e da Inteligência Artificial, caminhamos para uma transformação da clínica médica, antes baseada essencialmente na relação médico-paciente. Isso já está ocorrendo? E de que forma?

Luiz Vianna Sobrinho - Essa pergunta abrange quase toda a minha tese, então, vou procurar fazer um resumo do que ocorreu até alcançarmos a Medicina de Dados que temos hoje. No final do século XX, nas últimas décadas, temos a chegada na medicina, nas ciências da saúde, da revolução industrial eletroeletrônica, a chegada de insumos tecnológicos, tanto diagnósticos como terapêuticos, e o desenvolvimento da farmoquímica e da genética.

A medicina começa a trazer resultados como a ciência prometia no final do século XX, com impacto muito forte tanto no seu poderio, já muito marcante na sociedade, como na participação na economia. Economia da saúde, economia da atenção médica, passam a ocupar uma fatia muito grande da economia global antes da virada do século. Isso traz reflexos importantes para a própria prática médica.

Uma primeira consequência seria o uso demasiado desses insumos tecnológicos na década de 80 e 90, tanto pelo encanto dos resultados de aumento da eficácia, como pelo estímulo financeiro do modelo de remuneração médica pelo uso, pela prática. O que leva, também, ao aumento do dano. A iatrogenia (complicações causadas por tratamento médico) passa a ocupar lugar de destaque nas estatísticas de morbimortalidade, de mortalidade hospitalar em países de primeiro mundo e, também, no Brasil.

 

O que decorre a partir daí?

Isso aumenta muito o custo. Ao mesmo tempo em que, dentro da Economia da Saúde, do Complexo Médico Industrial da época, havia um estímulo muito forte à venda de insumos, com o desenvolvimento das corporações que passam a financiar o sistema privado, o desenvolvimento das corporações dos planos de saúde, do mercado de seguro da saúde, esse custo começa a ser inadequado. Então, vai haver, por um lado, o surgimento da medicina baseada em evidências, tentado regular do ponto de vista científico o uso demasiado de novas tecnologias e, por outro lado, as técnicas regulatórias do managed-care [cuidados gerenciados] – nasce a cultura do gerencialismo que começa a invadir a área médica, com ênfase na gestão financeira, na gestão sob o ponto de vista organizacional da corporação. Então, vemos na virada dos anos 2000 a chegada no país da medicina baseada em evidências, atrelada à cultura do managed-care; mecanismos regulatórios tentando reduzir esse custo ou tentando trazer esse custo a uma adequação financeira, mas ancorando isso do ponto de vista ético e científico, à evidência, garantias científicas de que aquelas práticas de utilização de insumos estavam mais corretas do que as decisões puramente individuais de cada profissional. Essa é uma mudança fundamental.

 

O que essa mudança nos traz?

É o primeiro impacto na autonomia profissional, em que, no momento da decisão, há argumentos que vêm de fora da experiência do profissional. A medicina, antes praticada individualmente, passa a ser influenciada por fatores mais ligados ao coletivo. Assim, a Epidemiologia passa a ter uma importância muito maior. No momento da decisão médica, a experiência profissional começa a perder valor para a chamada evidência científica, evidências de práticas ligadas a estudos randomizados, a estudos multicêntricos, ou seja, evidências que estão ligadas às práticas coletivas. Nesse ponto já começam grandes transformações que vão refletir na relação médico paciente e, além disso, na própria forma de praticar a medicina, o próprio modelo epistemológico em que ela se baseia. Com relação à relação médico-paciente, já havia uma crítica no pensamento sanitário, colocando a chegada da revolução tecnológica do final do século XX, do desenvolvimento de devices (dispositivos eletroeletrônicos de diagnósticos), como a principal causa da interferência no contato direto entre médico e paciente.

Vejo essa questão de forma diferente, porque vivi isso na prática e sempre discordei um pouco. Um estetoscópio, por exemplo, instrumento que surgiu no século XIX, também foi acusado de que iria interferir na relação médico-paciente. Hoje ele é visto quase que como uma extensão do corpo médico para o exame do paciente. Quando tive contato com o pensamento acadêmico, com a crítica sanitária à Biomedicina – há falas muito fortes das últimas duas décadas quanto à tecnologia eletroeletrônica da revolução médica do final do século XX ter afastado o médico do paciente. É obvio que houve um impacto na relação, não podemos subestimá-lo, mas não podemos dizer que ele é o responsável pelo afastamento do médico do paciente. Nesse sentido, é que eu digo que o instrumento estetoscópio, do ponto de vista científico, não é diferente de um aparelho de ressonância, ambos instrumentos de mediação diagnóstica, de busca de resultados anatomopatológicos, embora esse último seja muito mais sofisticado. Então, nesse exemplo, digo que estetoscópio e ressonância não são diferentes, para médicos que têm uma boa relação com o paciente.

 

A que você atribui essa mudança na relação médico-paciente?

Não atribuo ao uso da tecnologia eletroeletrônica, ou tecnologia-hard, esse afastamento da relação médico paciente. O afastamento entre médico e paciente observado a partir do final do século XX, não é exclusivo dessa relação, mas um fenômeno social que ocorreu em várias relações. Vejo fatores mais importantes como responsáveis por essas mudanças. Existe vasta literatura sociológica sobre isso, que trata do individualismo contemporâneo, do narcisismo do final desse século, perda de visão de coletividade, quer dizer, essas transformações sociais transpassam a relação médico paciente como todas as outras relações. Outro fator que, também, contribuiu para esse impacto foi o surgimento, na década de 70 e 80, de maior autonomia do paciente, que passa a ser mais um princípio ético de valor, defendido pela bioética desta época. Então, a relação médico-paciente muda no final do século, também, por outras questões, além da chegada dessas novas tecnologias. Muda porque a sociedade muda, as relações sociais entre profissional e paciente mudam e a autonomia do paciente passa a ser trabalhada como uma questão vital, inclusive para o mercado, que se aproveita do conceito para tomar o paciente como um consumidor. A defesa de direitos, a defesa de desejos. Enfim, é uma questão complexa.

Diante de um paciente que tem mais autonomia, que não espera decisões ou não espera informações, é justamente nesse ponto que nasce a medicina protocolar, a medicina baseada em evidências, que se descola da avaliação única, individual do paciente para vir com informações da Bioestatística. Há uma crítica da época, da sociologia médica, pela qual vamos ter uma epidemiologia que se preocupa menos com doença e com os status de doenças, para se preocupar mais com riscos, tendências e bioestatísticas de futuro. Então, a medicina passa de uma base centrada na doença, na anatomopatologia, no dado do paciente, para começar a focar em outra coisa. Que outra coisa seria essa? A Informação. Estamos entrando no mundo da informação, na virada dos anos 2000, e isso ocorre, também, na medicina.

 

Que mudanças paradigmáticas para a medicina representa a quarta revolução industrial, marcada por tecnologias avançadas, tais como big data e inteligência artificial, e a fusão do mundo físico e virtual?

Com a chegada da medicina baseada em evidência cai por terra o que se chama medicina baseada na autoridade, que é a opinião do especialista, baseada em sua experiência profissional. O que passa a ter maior valor nas tomadas de decisão são as evidências científicas, de estudos multicêntricos, randomizados, de grandes populações.

Isso é o começo da era da informação. A informação passa a ter um valor no olhar médico mais importante do que aquele dano que ele procura no exame ou na propedêutica em seu paciente. Informações que estão no espaço abstrato, no espaço científico, no espaço dos estudos. E a crítica que se faz a isso é uma crítica que deve ser cuidadosa, porque do ponto de vista científico isso é uma coisa muito importante. Vemos o valor hoje da medicina baseada em evidência no discurso da pandemia. No discurso político da pandemia. Como é importante se dispor de dados científicos bem balizados, contra opiniões pessoais, que podem variar e ter reflexos completamente diferentes na prática da medicina.

Isso muda a relação do médico com sua base epistemológica, que dizer, ele não está mais focado apenas na descoberta do dano anatomopatológico, que vai representar determinada doença, mas ele vai estar sempre atento à informação. A doença vira informação, o risco vira informação, a tendência vira informação. E essa informação é algo que está difuso, não está exatamente no corpo biológico do paciente. Esse mesmo grupo de sociologia da Universidade de York , do Reino Unido se refere a isso como a “scaped medicine” , não tem uma boa tradução, uma “medicina difusa”, uma “medicina virtual” já nasce nesse período e é nesse momento que o paciente também tem acesso a essa informação. Paciente com autonomia começa a procurar o “Dr. Google”. O paciente não vem mais ao consultório médico buscando sempre orientações, ele vem já com dados de sua evolução, com dados científicos feito às vezes com uma leitura muito tosca, primária. Então isso acaba mudando tanto a relação médico-paciente, trazendo conflitos, como a relação do médico com sua prática.

Vejo que há pouca atenção ainda no olhar sobre que médico é esse, que passa a prestar mais atenção numa bolsa de exames, no prontuário onde estão os dados do paciente. Como é que esse médico desenvolve sua técnica de trabalho?

Como isso transforma a sua própria maneira de fazer medicina se ele hoje é um médico voltado para dados? É nesse ponto que chego ao final da minha tese. Quando toda a medicina pode ser trabalhada em dados e perdemos o caráter subjetivo, perdemos aquilo que está para além do dado, aquilo que está na intuição, aquilo que pode ser talhado como uma metafísica médica; e tudo é reduzido à objetividade pura e completa que possibilita _ e aí não é nenhuma previsão, é algo que já está em curso _ o exame ser feito por chatbots (atendimento por robôs), com programas que analisam esses dados e fazem um diagnóstico sem nenhuma participação racional de qualquer profissional, nem enfermeira nem médico. A partir daí chegam a um raciocínio diagnóstico nesses algoritmos de última geração, justamente a partir de dados objetivos das queixas dos pacientes.

 

Como analisar esse cenário no que diz respeito ao SUS e à saúde suplementar/privada?

Para finalizar o ciclo, assim como a parte médica biológica da saúde pode ser reduzida ou transformada na objetividade plena dos dados, a sua parte financeira também. Então, no decorrer das últimas duas décadas o que a gente tem é a transformação de uma atenção médica numa atenção à saúde que passa a ser de gestão clínico-financeira. Esses dados são tanto de desempenho clínico, como de desempenho financeiro do sistema e isso obviamente interessa a quem faz a gestão do sistema e começa a adaptar a medicina baseada em evidência ao trabalho com esses resultados, a uma prática de gestão consequencialista do valor. Aí nós perdemos a noção de valor como princípio, e começamos a trabalhar com a noção de valor como consequência final, começamos a pensar em gestão, como tem-se falado em medicina baseada em valor, que é a entrega de melhores resultados por um preço mais baixo, por um custo mais baixo. Ela nasce com essa fala mesmo, 'o melhor resultado por dólar gasto', baseando em princípio científico.

A medicina baseada em evidência, mas buscando resultados financeiros. O médico gestor ou simplesmente o gestor, mas principalmente o clínico-gestor, que está interessado no desempenho clínico e financeiro, reduz tanto a parte clínica como a parte de gestão financeira da saúde aos seus resultados clínicos-financeiros. E isso só é possível, quando se consegue transformar tudo numa base comum que é o dado, o dado clínico do paciente, o dado financeiro. Esses dados percorrem as redes de gestão das grandes corporações e são trabalhados e vendidos hoje no que se chama de capitalismo de plataforma, como as novas commodities. Se vendem carteiras de pacientes, riscos de pacientes, custos, planos especializados em idosos. Isso é possível com as transformações que houve nas últimas duas décadas do pensamento na atenção médica, pensamento no que seja o substrato da doença para pensá-lo numa tradução total do homem, da sociedade, das doenças sob a forma de dados que é vital para se incluir a engrenagem da medicina na economia da saúde, no momento da era digital, dado do capitalismo digital que é outro termo bastante utilizado. Temos aí uma panorâmica geral da minha tese.

Ao nascer, o SUS encampa, num momento histórico, as ideias da Declaração de Alma Ata * e prioriza a atenção primária sabiamente como um projeto político, um projeto de grande reforma social, entendendo a saúde como uma grande oportunidade para uma reforma social, como uma verdadeira revolução de transformações sociais. De uma certa forma, afasta do pensamento da saúde priorizando, hierarquizando a biomedicina como o cuidado da doença, o foco na doença e no consumo de insumos. Todo o ponto de vista político é uma proposta muito forte que dá certo, mas parte do pensamento sanitário na época faz uma crítica forte ao cientificismo e quase que afasta as racionalidades científicas as práticas médicas mais ligadas à alta tecnologia. Isso cria uma divisão já na época e o mercado se apropria disso, ocupa os espaços políticos, os espaços do trabalho na área da biomedicina e praticamente assume toda a área de medicina terciária, da atenção hospitalar, focando justamente no cuidado da doença, nessa venda de insumos. Aproveita o momento político da década de 90 e usa os subsídios do Estado para organizar o seu parque hospitalar, enquanto o parque hospitalar público era sucateado.

 

Em seu último livro, O Ocaso da Clínica, você sublinha que o SUS, fruto do pensamento da Reforma Sanitária, ao buscar fugir de uma visão instrumentalista de consumo de serviços e tecnologias e priorizar os determinantes sociais da saúde, acabou adotando um modelo científico fraco. No que consiste o problema desse modelo, para ser considerado fraco? Que consequências para a atenção primária essa opção pode ter? E como fazer diferente?

Naquele momento histórico em que o movimento sanitário a partir do SUS tentava organizar o seu sistema a partir de um foco muito forte na atenção primária, como uma meta política, organizando o sistema de saúde a partir de uma visão mais global e não sempre com a visão da doença, uma grande parte do pensamento acaba afastando a biomedicina como uma coisa estigmatizada. É o modelo hospitalocêntrico, modelo focado na doença, e isso cria uma cisão dentro do próprio pensamento médico à época que eu acho que permanece até hoje.

A crítica que faço é que realmente é uma proposta política forte, mas não há uma proposta científica tão forte à mesma altura. Isso não é uma fala só minha. É muito importante que o próprio pensamento sanitário aproveite as transformações tecnológicas em prol de um bem coletivo, porque o mercado dominou a medicina, a medicina de alta tecnologia, a medicina terciária. Nós temos ilhas de atenção do SUS, onde nós temos medicina de alta tecnologia, mas o desenvolvimento das ciências médicas, consideradas tecnologias hard ligadas à atenção hospitalar e à medicina terciária praticamente foi dominado pelo mercado e levou com isso toda a classe médica, seja lá com que perfil de trabalho dentro da ótica do capital. Isso vai ter uma interferência muito forte porque é a parte que domina mais a economia da saúde, onde está toda a venda e a reprodução de insumos. Essa é, hoje, uma das preocupações, que eu externo no meu livro, na minha tese.

Aqueles que pensam o modelo de assistência, o modelo de atenção sanitária, o modelo de saúde voltado para coletividade, não voltado para a ótica de mercado, precisam ficar atentos para que o SUS não perca essa quarta revolução, que não deixe passar a revolução da informação, da tecnologia digital, do que tem se chamado de saúde digital, medicina digital; enfim, que consiga absorver esse impacto e produzir nesse campo a sua expansão, mas com outra ótica. Não com a ótica de mercado, quer dizer, não com a ótica de política de dados como commodities, de capitalismo de plataforma. O SUS tem que encontrar uma forma de ocupar esse espaço que desde cedo o mercado já vem ocupando.

As grandes corporações vêm dominando a área de informação e saúde, já montando as suas estruturas de capitalismo de dados, com trabalho de algoritmo justamente para a produção do excedente, do lucro, que é o seu interesse. Aqueles que pensam na reforma da reforma têm que estar atentos para usar o momento para desenvolver uma política de saúde que encampe a revolução da informação, mas com a visão da coletividade, com a visão que norteia o sistema único de saúde. Então um dos alertas que me fez mudar os rumos do que eu fazia no meu doutorado foi perceber que, sob o meu ponto de vista, o SUS perdeu força científica, na revolução tecnológica, na revolução eletroeletrônica, na chegada da tecnologia dura na década de 90, e precisa ficar atento para não perder essa quarta revolução, que chega na segunda década do nosso século e avança agora em direção a um novo modelo de saúde.

Temos que pensar que os sistemas que nós nos espelhamos, como, por exemplo, o sistema de saúde inglês ou talvez o sistema de Cuba, Canadá, os sistemas públicos, universais, eles têm uma forte organização escalonada. Eles não desprezaram a atenção hospitalar no momento correto e têm uma boa medicina hospitalar presente, marcante dentro do sistema de saúde, desenvolvido por esses países. O sistema de saúde inglês, por exemplo, se prepara de forma muito marcante desde a segunda metade da década passada para adaptar o seu modelo ao novo mundo da informação, ao novo mundo do que se chama saúde digital. Então é como um alerta para que não percarmos o bonde da história novamente para o mercado.

 

Em relação ao emprego das novas tecnologias em saúde, como elas poderiam contribuir para ampliar o acesso dos serviços de saúde? Em sua visão, caminhamos nessa direção ou as novas tecnologias irão ampliar ainda mais as desigualdades nesse acesso?

O poder da tecnologia da informação para ampliação do acesso ao serviço de saúde e para a melhoria da qualidade é fantástico, ainda mais num país com as nossas dimensões, nossas peculiaridades, nossas diferenças geográficas e sociais. Não resta dúvida que a tecnologia da informação pode ajudar o SUS na sua proposta de assistência com integralidade, com visão da coletividade.

A pandemia mostrou como isso é necessário, como o desenvolvimento e o aprimoramento dessas tecnologias são fundamentais e isso vem sendo um alerta já dado pelos países do primeiro mundo, conforme mencionei: a preocupação com o uso da inteligência artificial nos programas de gestão dos serviços públicos, dos serviços universais para que não aumentem justamente a distâncias sociais, para que esse uso não aumente os conflitos de má distribuição dos serviços de saúde. Justamente no primeiro mundo, onde se percebe que as grandes corporações estão interessadas na assistência através do sistema de informação está havendo essa preocupação, porque é um modelo que pode acentuar ainda mais essas iniquidades em saúde. É um modelo que passa então a explorar a atenção primária porque era uma área de baixa produtividade, mas com o uso da tecnologia da informação, da inteligência artificial é possível oferecer serviços.

O mercado agora se interessa por oferecer serviços em grande quantidade, no atacado, e isso pode criar um modelo de atenção primária totalmente diferente do que pensamos. Então é importante a gente estar atento, porque há um interesse já do mercado em ocupar esse espaço agora. Eles que eram muito focados na atenção terciária já vêm com programas e a gente tem visto palestras com desenvolvimento de produtos com call center para atenção primária. É outra forma de perceber a atenção primária, mas essa é a forma do mercado perceber, que seria transformar a atenção primária numa grande plataforma, num grande Ifood de saúde. É possível perceber essa tônica na discussão atual do openhealth, como ela já chega com esse programa do Ministério da Saúde, que denota claramente qual é a visão desse governo, desse modelo neoliberal para a política de dados em saúde. Então é importante que o movimento sanitário e aqueles que pensam o projeto de coletividade do SUS estejam atentos para o aproveitamento desse novo momento da revolução da informação.

 

Fonte: Andréa Vilhena. Imagem: Bernardo Portella.

 

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