Nascido em 7 de junho de 1901, filho de Francisco Vicente Gonçalves Penna e Luzia de Azevedo Penna, no Rio de Janeiro, Henrique de Azevedo Penna formou-se em medicina pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro (hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro), em 31 de dezembro de 1925. Frequentou os Cursos de Imunidade, Bacteriologia, Micologia e Zoologia Médica do Instituto Oswaldo Cruz, recebendo esses certificados de Carlos Chagas, em 1929. Seus primeiros trabalhos, em colaboração com J. da Costa Cruz, foram sobre a composição do complemento (que chamavam de alexina), publicados em 1932 (Costa Cruz & Penna, 1932a,b). 

Havia dois laboratórios de febre amarela, um na Bahia, desde 1931, e outro no Rio de Janeiro. Foi no laboratório da Bahia que Henrique de Azevedo Penna identificou, pela primeira vez no Brasil, em lâminas de viscerotomia negativas para febre amarela, 41 casos de leishmaniose visceral, provenientes de vários estados do Nordeste, principalmente Bahia e Ceará, mas também do Pará (Penna 1934). Esse trabalho pioneiro fez com que recebesse, do Instituto Oswaldo Cruz, em 1962, a medalha Gaspar Vianna. Essa descoberta deu origem a uma comissão, chefiada por Evandro Chagas, para investigar a ocorrência de leishmaniose visceral no Nordeste e Norte do Brasil, o que deu origem ao Instituto Evandro Chagas, de Belém.

 

Penna I  Penna II

Foto 1: Dr. Henrique de Azevedo Penna (o segundo a partir da esquerda), ao lado de outros médicos e técnicos durante trabalho
de 
campo para a Fundação Rockefeller. Goiás, 1935. Coleção Família Penna. Foto 2: Henrique de Azevedo Penna enfrentou
dificuldades durante os trabalhos de campo na época da campanha da Fundação Rockefeller, para erradicar o Aedes aegypti 

para realizar pesquisas sobre a febre amarela. Goiás, 1935. Coleção Família Penna

 

Penna colaborou para as pesquisas que conduziram ao descobrimento do ciclo selvagem da febre amarela, no Vale do Canaã, Espirito Santo (Soper, Penna, Cardoso, et al 1933), mas a sua grande contribuição foi para o desenvolvimento e produção da vacina de febre amarela, que é reconhecida internacionalmente. Suas investigações sobre o neurotropismo dos vírus vacinais em macacos foram relevantes (Lloyd & Penna 1933a,b; Penna 1936; Fox & Penna, 1943), bem como seus estudos de avaliação da imunidade contra febre amarela (Lloyd & Penna 1933c).

Thomas Monath afirma que a produção da vacina de febre amarela foi estabelecida no Brasil entre janeiro e março de 1937, por Henrique Penna e Hugh Smith (Monath 2011).  Henrique Penna fez passagens do vírus vacinal na cavidade amniótica de ovos de galinha embrionados, técnica aprimorada por Nicolau (1988), que passou a utilizar o saco vitelino para inoculação, melhorando o rendimento.  Penna introduziu também a técnica de remoção do embrião do ovo com tocha de oxi-acetileno, com isso evitando a contaminação, o que permitiu eliminar a adição de soro humano e filtração da produção e resolver o problema da hepatite causada pela vacina (Penna 1939). Foi ainda Penna quem introduziu o sistema de lote-semente, padronizando a produção, assegurando potência adequada da vacina e diminuindo eventos adversos, sistema este posteriormente utilizado por todos os produtores, da vacina de febre amarela e das demais, em todo o mundo.

Henrique Penna anotou cuidadosamente as passagens realizadas, com isso permitindo saber a genealogia da cepa vacinal atualmente em uso (Fox & Penna 1943; Kerr & Penna 1941-1943). Benchimol (2001) e Post et al. (2001) estudaram minuciosamente essa questão, que é relevante para o conhecimento da vacina de febre amarela.

 

 Penna IV  

Vê-se aqui, à esquerda, o aparelho desenvolvido por Penna, em 1939, num período em que a produção não tinha
ainda o ritmo da linha de montagem. À direita, operador remove embriões para o frasco onde serão triturados.
Os operadores usam máscaras e aventais esterilizados, e, antes da operação, escovam as mãos com água e
sabão e as lavam com álcool, seguindo os padrões assepsia da época. Rio de Janeiro, RJ, 1941-1943. 
Manual da Vacina/ LAFA/ Bio-Manguinhos/Fiocruz

 

Penna III

Reunião de trabalho com o staff do laboratório de febre amarela em Manguinhos: presentes 1- F. P. Hogan; 2- Fred L. Soper;
3- Loring Whitman; 4- Henrique Penna; 5- Madureira Pará; 6- Nelson Cerqueira; 7- Simon Kossobudisky; 8- Hugo Lemmertz;
9- Raymond Shannon; 10- Austin Kerr. Rio de Janeiro, provavelmente final da década de 1930. Coc/Fiocruz

 

Com Smith e Paoliello, Penna foi co-autor dos estudos clínicos mais importantes já realizados com a vacina de febre amarela, que permitiram a sua utilização em larga escala no Brasil e em outros países (Smith, Penna & Paoliello, 1938). Chama a atenção o grau de rigor científico e responsabilidade ética com que esses estudos foram feitos. Embora não seguissem a metodologia padronizada das exigências atuais de estudos clínicos, na prática a sequência seguida foi a recomendada até hoje: estudos pré-clínicos e estudos clínicos de fase I, II e III, com introdução gradual da vacina em grupos crescentes de pessoas, e decrescente de idade, com observação atenta dos eventos adversos, no período de fevereiro de 1937 a janeiro de 1938. Era a melhor ciência da época. Esse estudo é um marco na história de desenvolvimento das vacinas, e na verdade mostra como o desenvolvimento de uma vacina pode ser acelerado sem perder o rigor científico, lição que pode ser útil para os dias atuais, frente aos desafios de doenças emergentes ou reemergentes, que exigem resposta no tempo mais curto possível.

 

Penna V   Penna VI 

Foto 1- Ainda sobre Henrique de Azevedo Penna e a fabricação da vacina de febre amarela, vemos nessa foto que para
retirar os embriões inoculados, queimava-se um anel perto do pólo maior do ovo com a chama muito quente de um
maçarico oxi-acetilênico. A chama não
só corta a casca, como também a esteriliza. Um dispositivo movido por motor
elétrico, chamado
de máquina Pickles, com velocidade graduável, faz girar suportes de borracha em que são colocados
os ovos a serem abertos. O primeiro aparelho foi desenvolvido por Henrique Penna, 
no Rio de Janeiro, e os demais,
aperfeiçoados por E. G. Pickels. Rio de Janeiro, RJ, 1946. Manual
de Instruções Técnicas e Administrativas do Serviço
Nacional de Febre Amarela/ LAFA/
Bio-Manguinhos/Fiocruz. Foto 2- Outra inovação que contou com a contribuição de
Henrique de
Azevedo Penna é este procedimento para tampar os tubos de vacina com chumaços de algodão. Desenvolvido
pelo "sr. Hans", habilidoso mecânico austríaco que materializou algumas inovações
concebidas por Penna, o mecanismo fez
com que o algodão fosse empurrado para dentro dos
tubos, uniformemente. Rio de Janeiro, RJ, 1956.

 

 

A produção brasileira da vacina 17DD de febre amarela ficou consolidada no Instituto Oswaldo Cruz, graças à determinação e competência de Henrique de Azevedo Penna e seu grupo, em colaboração com a Fundação Rockefeller. No discurso que proferiu ao receber o Prêmio Nobel de Medicina em 1951, Theiler se refere por três vezes, respeitosamente, às pesquisas de Henrique Penna, fato mais significativo ainda pela solenidade do momento. 

A homenagem que é prestada por Bio-Manguinhos e pela Fundação Oswaldo Cruz a Henrique de Azevedo Penna, pesquisador criativo e inovador, líder inconteste nos primórdios do processo de desenvolvimento e produção da vacina, é justa e traduz um reconhecimento aos méritos e realizações desse grande cientista e cidadão brasileiro, cuja ação benemérita persiste até os dias atuais.

 

Texto: Akira Homma e Reinaldo de Menezes 

 

Confira o release na Sala de Imprensa.

 

 

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