aedes-100x100As doenças causadas por arbovírus têm sido analisadas de forma recorrente na mídia e nas bancadas dos laboratórios. Pesquisadores do Brasil e do mundo buscam, incansavelmente, a melhor maneira de detectar doenças como dengue, zika, chikungunya e febre amarela através de plasma, urina, entre outras fontes de material genético por meio dos testes moleculares ou sorológicos. O desafio está não só no diagnóstico mais preciso, como também na rapidez dos resultados, fazendo com que o paciente comece, imediatamente, o devido tratamento.

Para falar sobre estas problemáticas, foram convidados para o Workshop “Desafios para a detecção e diagnóstico diferencial precoce de infecção por arbovírus”, na manhã do dia 2/5, no V SACT, Ana Cecília Ribeiro Cruz (Instituto Evandro Chagas – IEC), Zilton Vasconcelos (Instituto Fernandes Figueira – IFF/Fiocruz), Thiago Souza (Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde - CDTS/Fiocruz) e Mario Santos Moreira, vice-presidente de Gestão e Desenvolvimento Institucional da Fiocruz.

 

Mayaro e febre do Nilo: preocupações atuais

Ana Cecília abordou os alvos específicos de diferenciação molecular de arbovírus. Ao abrir sua fala, explicou que as doenças causadas por esses tipos de vírus têm muitas semelhanças, como por exemplo, quadro febril e dores no corpo, o que clinicamente dificulta na detecção da doença. “Para que os resultados sejam mais confiáveis, o ideal é fazer mais de um teste, às vezes o molecular e o sorológico, pois ainda ocorrem falsos negativos. Os materiais devem ser limpos para não ocorrer contaminação cruzada, por exemplo”.

Ela apontou, ainda, que as enfermidades urbanas são as mais preocupantes e que o surgimento no último ano de mayaro e febre do Nilo devem ser observadas de perto. “Casos de febre do Nilo estão sendo investigados, alguns já foram confirmados no Piauí. Em Goiás, achava-se que as pessoas estavam contraindo chikungunya quando, na verdade, foi constatado através de testes que o surto era de mayaro. São preocupações atuais, não futuras. A vigilância deve ser mais contundente e os testes mais precisos e rápidos”, afirmou.

 

workshop arboviroses

Ana Cecília foi uma das convidadas a apresentar o Workshop no V SACT.
Imagem: Fábio Meirelles - Ascom / Bio-Manguinhos

 

Zika, microcefalia e outras correlações

Zilton comentou sobre os desafios de diagnóstico molecular e sorológico de zika durante a gravidez, uma das maiores preocupações do Ministério da Saúde desde que se descobriu a ligação desta enfermidade com o desenvolvimento de microcefalia nos fetos. Está sendo feito um estudo de coorte no IFF/Fiocruz com quase 200 mães que estavam com suspeita de zika. Essas mães e filhos terão o acompanhamento do instituto durante três anos. Foi necessário criar um biorrepositório para armazenar amostras de urina, cordão umbilical e líquido amniótico que estão sendo profundamente pesquisados.

“Foi realizado um teste sorológico multiplex para analisarmos se essas mães também foram expostas à dengue, entre outras arboviroses. Construir esse painel de amostras nos possibilitou fazer correlações entre as diversas patologias. A mãe que teve dengue antes da gravidez e foi infectada por zika ainda lactante, a chance de desenvolver microcefalia no bebê diminui, por exemplo? Existem muitas perguntas a serem respondidas e ainda há muito o que analisar e descobrir a partir destas amostras”, mostrou Zilton.

O pesquisador afirmou que o sistema nervoso central dos fetos é muito mais afetado quando a mãe se infecta por zika no primeiro trimestre de gravidez. “De 101 crianças, somente em 32 enxergamos a infecção. Nos primeiros seis meses de vida, ao realizarmos o Elisa, 22% do sangue analisado deu positivo para a doença. Nos primeiros quatro meses, fizemos um teste molecular e também em 22% do sangue deu positivo. Tivemos um caso de óbito de uma criança com seis meses e conseguimos detectar o vírus no tecido cerebral. Para darmos continuidade ao estudo, é necessário o desenvolvimento de um teste sorológico de IgM mais específico para grávidas”, concluiu.

 

Gargalos no diagnóstico

Thiago apresentou os gargalos no diagnóstico laboratorial das arboviroses durante a tríplice epidemia de 2016 (dengue, zika e chikungunya) e a epidemia atual de febre amarela. Thiago aponta as principais causas para o crescimento do número de casos nos últimos anos. “São elas: a destruição da cobertura florestal, os baixos indicadores de saneamento básico, o sofrível manejo do lixo urbano e a adaptação do vírus. O Brasil é o único país em que circula, simultaneamente, dois genotipos diferentes de chikungunya. Quatro genotipos de dengue apareceram nas últimas décadas. Novas arboviroses serão introduzidas nos próximos anos, vivemos uma situação emergente”, alertou.

Para ele, os principais desafios para o diagnóstico são: definição do caso clínico, coleta e diagnóstico numa janela de tempo oportuna (reforço da vigilância) e desenvolvimento de testes sorológicos com resultados inequívocos. “Verificou-se que, contando a partir do dia em que surge os sintomas, a melhor época de detectar a doença é nos primeiros cinco dias. Após esse período, há um declínio da carga viral, tornando quase impossível o diagnóstico”, explicou.

Foram feitos testes no Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz) e foram confirmados 1439 casos de dengue, zika e chikungunya entre março de 2016 e março de 2017. “No outono de 2016, constatou-se mais casos de chikungunya, enquanto que, no verão de 2017, observou-se um aumento de casos de zika. Verificamos, ainda, que a suspeita clínica da doença, muitas das vezes, se confirmou após os exames laboratoriais. No entanto, há ainda muitas dificuldades em determinar qual é a doença apresentada”, afirmou Thiago.

 

mario moreira

Mario Moreira apresentou os aspectos estratégicos de desenvolvimento
tecnológico 
e produção. Imagem: Gabriella Ponte - Ascom / Bio-Manguinhos

 

Aspectos estratégicos

Para falar dos aspectos estratégicos de desenvolvimento tecnológico e produção, o vice-presidente Mario Moreira apresentou quatro pontos problemáticos, como aspectos logísticos, tecnológicos, organizacionais e políticos. Muitos deles estão relacionados aos equipamentos defasados e falta de manutenção, assimetria de recursos laboratoriais, suprimento fragmentado de insumos, falta de capacitação em biologia molecular, ausência de testes diferenciais rápidos (tanto moleculares como sorológicos) e, principalmente, falta de financiamento na área.

“É muito difícil desenvolvermos novos produtos e mantermos um estoque estratégico sem financiamento. Isso é necessário para atendermos rapidamente às demandas emergenciais como epidemias, por exemplo. Deve haver definição de prioridades, um novo escopo de políticas públicas voltados para a saúde e novas estratégias de inovação que contemplem a realidade do país. Redes de cooperação clínica e de desenvolvimento tecnológico devem ser formadas para fortalecer nossa capacidade produtiva e não dependermos tanto da tecnologia estrangeira”, pontuou.

Mario Moreira citou diversos projetos que estão em andamento na Fiocruz, como parcerias com Finep e BNDES para o desenvolvimento de detecções tanto moleculares como sorológicas point of care dos principais patógenos (fungos e bactérias) e até de doenças negligenciadas. Entre os projetos, estão o teste molecular laboratorial de zika, dengue e chikungunya (Teste ZDC), desenvolvido por Bio-Manguinhos.

“É um teste diferencial PCR RT que já está registrado e em produção. Estamos finalizando a negociação com o Ministério da Saúde para não só cuidar da produção, mas oferecermos um serviço completo, desde a instalação e manutenção dos equipamentos necessários até a capacitação de pessoal para operar a plataforma. Queremos fortalecer a rede e torna-la mais uniforme para garantir a vigilância adequada e controle das doenças durante epidemias e surtos”, concluiu o vice-presidente.

 

Jornalista: Gabriella Ponte

 

 

 

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